A GESTÃO DEMOCRÁTICA NA ESCOLA
Hernando Feitosa Bezerra
Introdução
A educação nacional é organizada em “regime de colaboração”,
onde à União cabe a
“coordenação da política nacional de educação, articulando os diferentes níveis
e sistemas e exercendo função normativa, redistributiva e supletiva em relação
às demais instâncias educacionais” (Título IV, Artigo 8º da Lei 9394/96).
A redefinição de responsabilidades dos governos municipais,
estaduais e federal inclui estratégias de assistência técnica e financeira
geradas no nível central, a exemplo dos programas gerenciados pelo FNDE (Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação) do Ministério da Educação, que obriga
aos municípios criarem mecanismos de gestão para viabilizarem a participação da
comunidade no controle e execução das políticas como contrapartida para o
financiamento de projetos locais (como o FUNDEF - Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério) (AZEVEDO,
2002).
A União adota referenciais como a democracia e a
pluralidade, para caracterizar o que denomina de modelo de sistema educacional
competente, onde a administração de projetos é associada ao conceito de
eficiência de gestão.
Conforme a Lei, caberia aos estabelecimentos de ensino
“elaborar e executar sua proposta pedagógica”, e aos docentes participar de sua
elaboração, além de elaborar e cumprir seu próprio plano de trabalho em
conformidade com a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino.
Algumas estratégias foram, então, instituídas pelos governos
municipais e estaduais para viabilizar as determinações do governo central,
como a exigência da criação dos Conselhos Escolares e a elaboração por parte
das escolas de um Projeto Político Pedagógico (PPP), um Plano de
Desenvolvimento Escolar (PDE), a instituição da Unidade Executora (UEX),
estratégias estas vinculadas aos princípios da gestão democrática e da
autonomia escolar.
Este trabalho tem como objeto de estudos a gestão
democrática formalmente proposta no sistema educacional brasileiro e a emergência
de padrões de comportamento e códigos de conduta que afloram na organização
escolar com vistas a compreender a sua cultura no âmbito do debate sobre a
gestão democrática.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional define as
normas da gestão democrática do ensino público conforme os princípios da
“participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico
da escola” e da “participação das comunidades escolar e local em conselhos
escolares ou equivalentes”, bem como “progressivos graus de autonomia
pedagógica e administrativa e de gestão financeira”, assegurando, portanto, a
participação dos diversos segmentos na organização escolar e a autonomia das
unidades escolares públicas de educação básica, dois elementos que fundamentam
a análise aqui desenvolvida. (BRASIL, 1996, Lei nº 9394/96).
A literatura sociológica brasileira nos mostra que nos anos
1960 e 1970 a
educação foi enfatizada como elemento central para o processo de
desenvolvimento econômico e social. Esse foco foi redirecionado nos anos 80
numa conjuntura de democratização política, quando eram confirmados os baixos
índices de rendimento do sistema educacional, considerados como um dos
obstáculos à consecução da educação como um direito, como formação para a
cidadania crítica, consciente e participativa.
Nos anos 1990, período caracterizado como da sociedade do
conhecimento, reformula-se a perspectiva de cidadania adotada na política
educacional brasileira e a discussão passa a ser centrada principalmente na
reorganização da gestão escolar onde ganha relevo a participação nas tomadas de
decisões coletivas. Do ponto de vista pedagógico, é enfatizado o
desenvolvimento de competências e habilidades.
É nesse contexto que a autonomia institucional, disposta
como democracia participativa na Constituição Federal de 1988 e consolidada na
Lei 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), torna-se
estratégica para efetivar a descentralização política e financeira no setor
educacional.
Desse modo, as políticas educacionais implementadas a partir
de meados dos anos 90 reorientaram freqüentemente as responsabilidades
administrativas para com os diversos níveis e modalidades de ensino, o que
amplia, em alguns estados, o volume de ação tanto da esfera municipal que, além
da educação infantil responsabiliza-se também pelo ensino fundamental, como o
da esfera estadual que assume, prioritariamente, o ensino médio.
Essa redefinição tem sido denominada de perspectiva
democrática restrita, conforme anota Azevedo,
“Trata-se de uma forma de descentralização que pode ser
categorizada como economicista-instrumental, (...) em que o local é considerado
como uma unidade administrativa a quem cabe colocar em ação políticas
concebidas no nível do poder central.” (AZEVEDO, 2002:55)
É, certamente, a lógica economicista-instrumental que subjaz
ao projeto da sociedade global e, no caso brasileiro, a política educacional
tem requerido ajustes nas formas de gestão do sistema de ensino e das escolas,
dando origem a novos modelos de gerenciamento organizacional.
Discutindo o conceito de democracia
A diversidade de significados atribuídos ao conceito
democracia nos remete à acepção original do termo. Tendo origem na Grécia
Antiga, traz o sentido amplo de governo do povo, compreendendo especificamente
aqueles indivíduos considerados cidadãos, excetuando mulheres, escravos e
crianças. Desde então, a concepção de democracia identifica um determinado
nível de participação nas decisões comunitárias, mas o significado dessa
participação não é consensual.
Assim, se na Grécia Antiga, o sentido da participação é
restritivo à participação na vida política pública, na sociedade moderna é
ampliado em consideração à revisão do próprio conceito de cidadania, que passa
a incorporar um conjunto de direitos e deveres individuais, sociais, econômicos
e culturais. A igualdade democrática de participação diz respeito, então, às
dimensões política e social.
Vale ainda destacar que, na polis grega, a democracia era
direta, ou seja, os cidadãos reuniam-se e tomavam decisões diretamente
relacionadas ao modo de vida, modo distinto do que no contexto do estado
moderno, onde a complexidade e a dimensão da população exigem práticas
democráticas diferenciadas, mais especificamente indiretas ou representativas.
A participação nas decisões políticas é então assegurada via direito, que é
estabelecido socialmente através de um conjunto de regras, como a constituição.
Neste sentido, o Estado moderno tende a incorporar a
participação da sociedade civil nos processos de decisão e controle político.
No contexto atual, democracia tem sido colocada como a melhor maneira de
defender os direitos individuais (liberdade individual), sendo que a tônica da
discussão democrática passa das dificuldades do governo de todos para as
dificuldades de governabilidade diante de uma sociedade tão complexa. (ESTÊVÃO,
2002)
Bobbio (1988: p.73) trata da distinção entre a
democratização do estado e a democratização da sociedade, considerando que num
estado democrático podemos encontrar uma sociedade cujas instituições (escola,
família, serviços) não seguem a lógica democrática. Desta forma, tão importante
quanto a dimensão política (quem pode votar), é a dimensão social (quais os
espaços institucionais e organizacionais da democracia). Contrapõe-se
democracia participativa e democracia representativa centralizada e enfatiza-se
que uma democracia política só existe se for também democracia social.
A democracia social, segundo Santos (2001:243), relaciona-se
à cidadania social relativa à “conquista de significativos direitos sociais, no
domínio das relações de trabalho, da segurança social, da saúde, da educação e
da habitação por parte das classes trabalhadoras”.
Entretanto, a concessão dos direitos sociais e das
instituições que se encarregam de distribuí-los socialmente revela-se não
apenas como alargamento de direitos, mas também como ampliação da obrigação
política, ou seja, da integração política das classes trabalhadoras no Estado.
Os direitos sociais fazem parte do desenvolvimento da sociedade como uma forma
de controle sobre os indivíduos.
Democracia é também associada à liberdade de escolha dos
dirigentes, o que significa limitação de poder e traz subjacente as idéias
tanto de proteção, quanto de ameaça (via regulação). Nestes termos, o conceito
é também associado à liberdade de mercado, compreendida como proteção das
preferências individuais ou liberdade (individual) de escolha, o que gera
oposição à proteção de direitos sociais (da coletividade) e pode ser chamada de
democracia liberal.
A expressão democracia política é também utilizada em
contraposição à democracia social quando entendida como expansão do poder
ascendente dos cidadãos e se relaciona ao nível dos aspectos substantivos da
organização das instituições sociais.
Quando Bobbio (1988) afirma que democratização significa
passar da democracia política para a democracia social, conforme tratamos
acima, enfatiza não apenas passar da democratização do Estado para a
democratização da sociedade, processo formal que implica em vários centros de
poder na sociedade (desconcentração).
Isso quer dizer que não basta instituir soluções de caráter
normativo para que haja democracia e participação na sociedade: faz-se
necessário o debate social e o surgimento da necessidade desta forma de
organização nos diversos contextos, inclusive no nível institucional. Caso
contrário, corre-se o risco de um reducionismo burocratizante.
Referências
AZEVEDO, Janete Lins (2002). Implicações da nova lógica de
ação do Estado para a educação municipal. Educação
e Sociedade. CEDES, vol.23,n. 80. São Paulo: Cortez.
BOBBIO, Norberto. (1988). Liberalismo e cultura. São Paulo: Brasiliense.
BRASIL. (1996) Lei 9394 de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional. Brasília.
ESTÊVÃO, Carlos. (2002). Globalização, metáforas organizacionais e mudança educacional:
dilemas e desafios. Porto, Portugal: Edições Asa.
SANTOS, Boaventura de S. (2001). Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 8ª.ed.
São Paulo: Cortez.
UMA PEDRA NO CAMINHO
Pretendo neste trabalho descrever sobre a palavra pedra nos trabalhos de Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto. dois dos maiores noetas brasileiros do século passado.
As escolas literárias nos dão um norte para esta questâo pois se no romantismo temos as musas etéreas, os amores impossíveis, no gongorismo essas musas começam a descer à
terra e a serem mais "palpáveis" em poetas como castro Alves, mas assim mesmo a poesia ainda estava impregnada de uma melosidade, uma coisa melodramática que ainda hoje
encontramos com muita força nos versos das canções populares e em muitos poetas que se acham modernos. Com a chegada do modernismo se faz necessária uma mudança radical de postura cultural no sentido de se valorizar o que aqui fazíamos como povo que tenta se libertar do jugo das influências coloniais. E evidente que os artistas brasileiros beberam nas fontes européia e gostaram tanto que voltaram ao Brasil com "sede" de mudanças e estas foram significativas em vários ramos da arte: música, pintura, poesia. escultura, etc... Vou me ater fundamentalmente à poesia pós 45, período no qual o modernismo se reafirma. Dos primeiros modernistas temos por pilares Mário de Andrade e Oswald de Andrade, alguns anos mais tarde temos João Cabral de Melo Neto e Carlos Drummond de Andrade como os novos pilares da nova poesia brasileira. O poeta, seja ele de qualquer época, sempre procurou o equilíbrio entre o mundo exterior e o seu mundo interior, equilíbrio ténue uma vez que cada expirar vira passado e o inspirar esperança de futuro. Muitos naufragam no meio do caos exterior, outros no meio do caos interior. Onde buscar equilíbrio se a mais arraigada disposicão do ser humano é a da segurança, da não mudança e por consequência, da estagnação? haja vista, a resistência a quaquer mudança que se avizinhe no caminho cultural. Aqui chego no ponto. O poeta, o artista em geral, procura equilibrar-se no vazio, tendo plena consciência da morte. O povo em geral, mais sábio, tenta equilibrar-se no concreto: casa, comida, trabalho (ainda que escravo), o povo tenta eternizar-se em sua prole; o poeta tenta sublimar a morte tentando eternizar-se em sua obra. João Cabral de Melo Neto é povo, e sua palavra é pedra, seu rosto é pétreo, sua poesia é sólida. Cabral não quer sustentar-se no vazio, precisa olhar, ver as cores, os tons, as formas desse grande circo, precisa sentir o volume, apalpar as carnes...Veja o poema Frutas de Pernambuco.
Pernambuco tão masculino
que agrediu tudo, de menino,
é capaz das frutas mais fêmeas
e da femeesa mais sedenta,
são ninfomaníacas, quase,
no dissolver-se, no entregar-se, sem nada guardar-se, de puta, mesmo nas ácidas, o açúcar,
é tão carnal, grosso, de corpo,
de corpo para corpo, o coito.
que mais na cama que na mesa
seria cómodo querê-las.
João Cabral prefere acreditar que o mundo é uma grande pedra que serve de âncora impedindo o poeta de afastar-se da terra, da lida. de ser humano. A palavra de João Cabral não dá margens a devaneios inúteis, não cria deuses e muito menos deixa-se endeusar ou envolver-se nas ondas de crendices e superstições tão caras aos poetas em seral. O sentido de terra, de chão impregna toda obra de João Cabral, pois nascido no nordeste, conheceu mais do que ninguém as agruras do sertanejo, observe isso no poema o Luto do Sertanejo.
Pelo sertão não se tem como não se viver sempre enlutado; lá o luto não é de vestir, é de nascer com, luto nato.
sobe de dentro, tinge a pele de um fosso fundo! é quase raça:
luto levado toda vida e que a vida empoeira e desgasta.
e mesmo o urubu que ali exerce, negro tão puro noutras praças, quando no sertão, usa a batina negra-fouveiro. pardavasca.
Essa agrura, essa visão dura ficou dentro de João Cabral e ele levou para todos os lugares que foi mundo afora, o cheiro, o gosto, a angústia, nunca o sonho, aliás até a música ele renegou por ser o meio mais simples de inebriar um coração aflito. O poeta não se entregou às facilidades das sete notas musicais e preferiu as sete maravilhas do mundo. Deve-se notar que muitas das religiões, muitos dos credos, basearam suas crenças em grandes montanhas ou montes, numa procura simbólica por Deus. João Cabral sempre preferiu tirar cobre, ferro, diamantes ou cristais dessas montanhas e transformá-los em construções onde pode-se sentir o poder humano sobre a matéria, vejo isso no poema
O Engenheiro,
A luz. o sol. o ar livre envolvendo
o sonho do engenheiro.
o engenheiro sonha coisas claras: superfícies, tênis, um copo de água.
o lápis, o esquadro, o papel;
o desenho, o projeto. o número,
o engenheiro pensa o mundo justo,
o mundo que nenhum véu encobre.
Certas tardes subíamos ao edifício,
a cidade diária, ganhava um pulmão
de cimento e vidro.
A água, o vento, a claridade, de um lado o rio. no alto as nuvens
situam a natureza o edifício crescendo de suas forças simples.
Carlos Drummond de Andrade nada paralelamente a Cabral, mas sua pedra fundamental é diferente. Em João Cabral a pedra de toque é a desolação, a angústia, a tristeza que fixa o poeta ao solo e o faz "cimentar" seus sentimentos com palavras objeto ou substantivas. Em Drummond a pedra de toque é o tédio, o marasmo. A falta de perspectiva do próprio poeta faz com que ele lute interiormente para mudar sua vida. observe o poema Cidadezinha
Qualquer.
Casas entre bananeiras mulheres entre laranjeiras pomar amor cantar.
um homem vai devagar, um cachorro vai devaear. um burro vai devagar.
devagar... as janelas olham, êta vida besta, meu Deus.
Carlos Drummond é um rapaz tímido do interior de Minas e não se conforma com a lentidão e a preguiça das horas de Itabira. sua cidade natal. O poeta quer movimento, quer mudança, pois tem o pulsar jovem e não quer observar a vida passar monótona pelas janelas, e nem ser observado como bicho estranho através dos olhos impotentes das janelas.
Carlos Drummond precisa partir, precisa voar. Aaui faço um preâmbulo apenas nara salientar eme ambos CD.A e João Cabral saíram de suas cidades e foram para o Rio de Janeiro, mas tanto um como outro,, na verdade, nunca deixaram seu torrão, pois tudo o aue escreveram remete-nos à terra natal deles^ claro, de forma particular mas ambos conservaram-se interioranos mesmo dentro de grandes metrópolis.
Carlos Drummond de Andrade tinha um lado & Cabraliano menos duro, menos inflexível. Se João Cabra! é pedra, Carlos Drummond empresta um pouco de alma a essa pedra e ela torna-se tão real que impede aue o poeta a ignore. A pedra no caminho de Daimmond talvez seja a mesma no caminho de todo ser vivo mas em especial no caminho do ser humano que por ser finito enquanto matéria vê nessa finitude a constatação de não importa onde estejamos se numa cidadezinha qualquer ou em Madri(a pedra estará lá, lembrando-
nos sempre que somos passageiros nesta nave. Se a morte para João Cabral é a morte do outro, para Drummond ela é sua morte, então é preciso encontrar um significado para a vida. é preciso solidificar a palavra. Enauanto o corpo vai se esfarelando e o tempo corre ligeiro a palavra deve permanecer perene para além de pedra no caminho de todos, Carlos Drummond cismava mais, pensava mais, trabalhava a palavra como um escultor, seu mundo era seu pensamento e seu pensamento precisava da palavra coisa, objeto. no entanto
todo o seu mundo cabia numa escrivaninha e numa estante de livros, já João Cabra! gostava
de lugares, de gente, precisava do movimento das coisas, era pedra em movimento, era eterno retirante. Carlos continuava em Itabira e viajava o mundo à sua maneira, ambos se negavam a ser românticos, mas não negavam o romantismo aos que os lêem, concluindo poderíamos dizer que João Cabral de Melo Neto e Carlos Drummond de Andrade foram homens cordiais, são génios que parecem pairar sobre as emoções humanas mas não conseguem negar a paixão que verso a verso podemos sentir pulsar em seus poemas, resta-nos apenas a constatação de que há uma pedra no caminho e precisamos aprender com ela
queiramos ou não.
UMA PEDRA NO CAMINHO
Pretendo
neste trabalho descrever sobre a palavra
pedra nos trabalhos de Carlos Drummond de Andrade
e João Cabral de Melo
Neto. dois dos maiores noetas brasileiros do século passado.
As escolas literárias nos
dão um norte para esta questâo pois se no romantismo temos as musas etéreas, os
amores impossíveis, no gongorismo essas musas começam a descer à
terra e a serem mais "palpáveis"
em poetas como castro Alves,
mas assim mesmo a poesia ainda estava
impregnada de uma melosidade, uma coisa melodramática que ainda hoje
encontramos
com muita força nos versos das canções populares e em muitos
poetas que se acham modernos. Com a chegada
do modernismo se faz necessária
uma mudança radical de postura cultural
no sentido de se valorizar o que
aqui fazíamos como povo que tenta se libertar do jugo das influências coloniais.
E evidente que os artistas brasileiros beberam nas
fontes européia e gostaram
tanto que voltaram ao Brasil com "sede" de mudanças e estas
foram significativas em vários
ramos da arte: música, pintura,
poesia. escultura, etc...
Vou me ater fundamentalmente à poesia
pós 45, período no qual o modernismo
se reafirma. Dos primeiros modernistas temos por pilares
Mário de Andrade
e Oswald de Andrade, alguns
anos mais tarde temos João Cabral de Melo Neto e Carlos
Drummond de Andrade como os novos
pilares da nova poesia brasileira. O poeta, seja ele de qualquer época, sempre
procurou o equilíbrio entre o mundo
exterior e o seu mundo interior,
equilíbrio ténue uma vez que cada expirar vira passado e o inspirar
esperança de futuro. Muitos naufragam no meio do caos exterior, outros no meio
do caos interior. Onde buscar equilíbrio se a mais
arraigada disposicão do ser humano é a da
segurança, da não mudança e por
consequência, da estagnação? haja vista, a resistência a quaquer mudança que se
avizinhe no caminho cultural. Aqui chego no ponto. O poeta, o artista
em geral, procura equilibrar-se no vazio, tendo plena consciência da morte. O povo
em geral, mais sábio, tenta equilibrar-se no concreto: casa, comida, trabalho
(ainda que escravo), o povo tenta eternizar-se em sua prole; o poeta
tenta sublimar a morte tentando eternizar-se em sua obra. João Cabral de Melo
Neto é povo, e sua
palavra é pedra, seu rosto é pétreo, sua poesia é sólida. Cabral não quer
sustentar-se no vazio, precisa olhar, ver as cores, os tons, as formas desse
grande circo, precisa sentir o volume,
apalpar as carnes...Veja o poema
Frutas de Pernambuco.
Pernambuco
tão masculino
que
agrediu tudo, de menino,
é capaz das frutas mais fêmeas
e da
femeesa mais sedenta,
são
ninfomaníacas, quase,
no
dissolver-se, no entregar-se, sem nada guardar-se, de puta, mesmo nas ácidas, o açúcar,
é tão
carnal, grosso, de corpo,
de
corpo para corpo, o coito.
que
mais na cama que na mesa
seria
cómodo querê-las.
João Cabral prefere
acreditar que o mundo é uma grande pedra que serve de âncora impedindo o poeta
de afastar-se da terra, da lida. de ser humano. A palavra de João Cabral não dá
margens a devaneios inúteis, não cria deuses e muito menos deixa-se endeusar ou
envolver-se nas ondas de crendices e superstições tão caras aos poetas em
seral. O sentido de terra, de chão impregna toda obra de João Cabral, pois
nascido no nordeste, conheceu mais do que ninguém as agruras do sertanejo,
observe isso no poema o Luto do Sertanejo.
Pelo sertão não se tem como não se viver
sempre enlutado; lá o luto não é de vestir, é de nascer com, luto nato.
sobe
de dentro, tinge a pele de um fosso fundo! é quase raça:
luto levado toda vida e que
a vida empoeira e desgasta.
e mesmo o urubu que ali
exerce, negro tão puro noutras praças, quando no sertão, usa a batina
negra-fouveiro. pardavasca.
Essa agrura, essa visão
dura ficou dentro de João Cabral e ele levou para todos os lugares que foi
mundo afora, o cheiro, o gosto, a angústia, nunca o sonho, aliás até a música
ele renegou por ser o meio mais simples de inebriar um coração aflito. O poeta
não se entregou às facilidades das sete notas musicais e preferiu as sete
maravilhas do mundo. Deve-se notar que muitas das religiões, muitos dos credos,
basearam suas crenças em grandes montanhas ou montes, numa procura simbólica
por Deus. João Cabral sempre preferiu tirar cobre, ferro, diamantes ou cristais
dessas montanhas e transformá-los em construções onde pode-se sentir o poder
humano sobre a matéria, vejo isso no poema
O Engenheiro,
A luz. o sol. o ar livre envolvendo
o sonho do engenheiro.
o engenheiro sonha coisas
claras: superfícies, tênis, um copo de água.
o lápis, o esquadro, o
papel;
o desenho, o projeto. o
número,
o engenheiro pensa o mundo
justo,
o mundo que nenhum véu
encobre.
Certas tardes subíamos ao
edifício,
a cidade diária, ganhava um
pulmão
de
cimento e vidro.
A água, o vento, a
claridade, de um lado o rio. no alto as nuvens
situam a natureza o
edifício crescendo de suas forças simples.
Carlos
Drummond de Andrade nada paralelamente a Cabral, mas sua pedra fundamental é
diferente. Em João Cabral a pedra de toque é a desolação, a angústia, a
tristeza que fixa o poeta ao solo e o faz "cimentar" seus sentimentos
com palavras objeto ou substantivas. Em Drummond a pedra de toque é o tédio, o
marasmo. A falta de perspectiva do próprio poeta faz com que ele lute
interiormente para mudar sua vida. observe o poema Cidadezinha
Qualquer.
Casas
entre bananeiras mulheres entre laranjeiras pomar amor cantar.
um homem vai devagar, um
cachorro vai devaear. um burro vai devagar.
devagar... as janelas
olham, êta vida besta, meu Deus.
Carlos
Drummond é um rapaz tímido do interior de Minas e não se conforma com a
lentidão e a preguiça das horas de Itabira. sua cidade natal. O poeta quer
movimento, quer mudança, pois tem o pulsar jovem e não quer observar a vida
passar monótona pelas janelas, e nem ser observado como bicho estranho através
dos olhos impotentes das janelas.
Carlos Drummond precisa
partir, precisa voar. Aaui faço um preâmbulo apenas nara salientar eme ambos
CD.A e João Cabral saíram de suas cidades e foram para o Rio de Janeiro, mas
tanto um como outro,, na verdade, nunca deixaram seu torrão, pois tudo o aue
escreveram remete-nos à terra natal deles^ claro, de forma particular mas ambos
conservaram-se interioranos mesmo dentro de grandes metrópolis.
Carlos
Drummond de Andrade tinha um lado & Cabraliano menos duro, menos
inflexível. Se João Cabra! é pedra, Carlos Drummond empresta um pouco de alma a
essa pedra e ela torna-se tão real que impede aue o poeta a ignore. A pedra no
caminho de Daimmond talvez seja a mesma no caminho de todo ser vivo mas em
especial no caminho do ser humano que por ser finito enquanto matéria vê nessa
finitude a constatação de não importa onde estejamos se numa cidadezinha
qualquer ou em Madri(a pedra estará lá, lembrando-
nos
sempre que somos passageiros nesta nave. Se a morte para João Cabral é a morte
do outro, para Drummond ela é sua morte, então é preciso encontrar um
significado para a vida. é preciso solidificar a palavra. Enauanto o corpo vai
se esfarelando e o tempo corre ligeiro a palavra deve permanecer perene para
além de pedra no caminho de todos, Carlos Drummond cismava mais, pensava mais,
trabalhava a palavra como um escultor, seu mundo era seu pensamento e seu
pensamento precisava da palavra coisa, objeto. no entanto
todo o seu mundo cabia numa
escrivaninha e numa estante de livros, já João Cabra! gostava
de lugares, de gente,
precisava do movimento das coisas, era pedra em movimento, era eterno
retirante. Carlos continuava em Itabira e viajava o mundo à sua maneira, ambos
se negavam a ser românticos, mas não negavam o romantismo aos que os lêem,
concluindo poderíamos dizer que João Cabral de Melo Neto e Carlos Drummond de
Andrade foram homens cordiais, são génios que parecem pairar sobre as emoções
humanas mas não conseguem negar a paixão que verso a verso podemos sentir
pulsar em seus poemas, resta-nos apenas a constatação de que há uma pedra no
caminho e precisamos aprender com ela
queiramos
ou não.
AS TRANSGRESSÕES DE CAMÕES
1. INTRODUÇÃO
Falar
sobre a importância de Camões é algo, antes de tudo, prazeroso. Isto porque o
poeta reuniu, em sua obra, o reflexo de si mesmo pois Camões, como homem,
atraía a atenção das belas mulheres, amando-as ao mesmo tempo em que amava sua Pátria; como poeta,
exaltava-as, idealizava-as, sem deixar de lado a Razão (característica de sua
época).
Além do forte
lirismo que marca sua obra, Camões esmerou-se na poesia épica, contando, com
brilhantismo, os feitos heróicos de seu povo na belíssima epopéia Os
Lusíadas.
Ambos os estilos
– lírico e épico – influenciaram outros poetas, como bem diz Massaud Moisés em
sua obra A literatura portuguesa através dos textos, p. 72: “Em
primeiro lugar, pelo fato de obedecerem ao princípio da imitação, quer dizer,
da aceitação de modelos preexistentes à elaboração da obra de arte, sejam eles
os escritores greco-latinos, sejam os modernos que lhes seguiram as pegadas.”
Assim, vemos
Camões a partir do Classicismo em quase todas as Escolas Literárias chegando
até nossa geração: ora através da forma, do racionalismo; ora pela beleza, pela
musicalidade de seus versos; outras vezes pela universalidade dos temas. Enfim,
ao analisarmos atentamente alguns poetas, vemos que, certamente, Camões ali
esteve inspirando-os em mais uma obra-prima.
No decorrer
deste trabalho, explicitaremos essa influência camoniana comparando-o a alguns
poetas que o sucederam, até mesmo os contemporâneos.
2. O POETA
Luís Vaz de
Camões é o maior poeta do Classicismo português e um dos maiores da Literatura
Universal. Escreveu poesias líricas e o poema épico Os Lusíadas.
Sua poesia
lírica apresenta dois aspectos distintos: de um lado, Camões continua na linha
dos poetas medievais, escrevendo na medida antiga e expressando sentimentos e
emoções numa linguagem simples, vocabulário popular e com muita musicalidade.
Por outro
lado, faz, também, poesias na medida nova (soneto), inspirando-se nas idéias
renascentistas. Seu estilo, aqui, é mais sutil, mais elaborado, quase sempre
revelando uma atitude racional na tentativa de compreender e analisar seus
estados de alma: o Amor, a Vida e o Destino.
A poesia épica
portuguesa e renascentista tem em Os Lusíadas sua maior realização.
Narrando os
feitos portugueses na época das navegações, o poema trata da viagem de Vasco da
Gama às Índias. O verdadeiro herói dessa epopéia é o povo português,
representado pelo navegador, mostrando sua força, partindo para as conquistas e
dominando a natureza.
Percebe-se aí
a ligação do poema com o ambiente renascentista, época de valorização e
afirmação do homem, orgulhoso e consciente de suas forças.
2.1. Camões épico:
A obra épica
de Camões foi a mais bela expressão nacionalista do poeta em relação ao povo
português que já estava preparado, social e psicologicamente, para esse tipo de
poesia que, uma hora ou outra, haveria de acontecer, tendo em vista os fatos
históricos vivenciados por aquele povo.
O amor de
Camões pela Pátria era tão grande que, pouco antes de seu falecimento, numa
carta ao amigo D. Francisco de Almeida, confidenciou:
“Enfim,
acabarei a vida e verão todos que fui tão afeiçoado à minha pátria, que não me
contentei de morrer nela, mas com ela.”
Esse desabafo
deu-se em virtude de Portugal ter aclamado rei o Cardeal D. Henrique que não
teria condições de garantir sucessão legítima e Portugal acabou caindo nas mãos
de Filipe II.
É evidente que
diante desse amor, nada expressaria melhor que um poema épico, onde ficassem
registrados todos os feitos heróicos daquele povo tão amado pelo poeta.
A fidelidade à
sua Pátria é, pois, traduzida nessa
obra, que também é fiel aos fatos históricos por que passou Portugal, fato este
que não prejudica, em momento algum, o que no poema é mais importante: A
poesia.
Além de narrar
os fatos heróicos de seu povo, Camões não deixou de utilizar sua lírica – tão
bem colocada e apropriada – nos diversos cantos da epopéia. Isto, aliás, foi o
que deu originalidade à obra que o imortalizou e fez com que outros poetas
tentassem uma imitação, mas que ficaram, apenas, na tentativa pois, até hoje,
não houve quem conseguisse ultrapassar a mestria e genialidade de Camões.
2.2. Camões
lírico:
Durante muito
tempo, a genialidade de Os Lusíadas – reconhecidamente a maior
epopéia do Renascimento – deslocou e absorveu quase tudo que se lia de Camões.
Hoje, e cada vez mais, a sua lírica vem sendo reconhecida como poesia da mais
alta expressão, que nada deve à épica.
A permanente
atualidade dos poemas amorosos e reflexivos tem sido contínuo motivo de
espanto. A multiplicidade de vozes e perspectivas, a dramaticidade das
contradições, a flexibilidade dos ritmos, a surpreendente fabulação de imagens,
as inesperadas danças de conceitos, têm revelado a obra de Camões como uma das
mais importantes líricas da literatura ocidental.
O fundamental
da lírica está nas redondilhas e nos sonetos. Encontram-se em
seus poemas basicamente dois grandes pólos, duas grandes estruturas métricas: a
chamada medida velha, os versos de cinco e de sete sílabas poéticas, as
redondilhas menores e maiores, respectivamente, e a chamada medida nova,
os versos de dez sílabas que passaram a ser conhecidos como decassílabos
‘camonianos’.
No entanto,
mais do que métricas, no sentido de medida silábica, de contagem de sílabas,
trata-se, evidentemente, de ritmos. De um lado, os ritmos leves e ligeiros dos
versos em redondilhas, enraizados na tradição popular e medieval; de outro, a
espontaneidade e a leveza desses metros é recriada por Camões com graciosidade
dificilmente superável.
Os temas e
motivos são originados de fontes populares, de cantigas de amor e de amigo, e
também da poesia palaciana. Além destes, encontram-se, também, ainda na medida
velha, poemas reflexivos, filosófico, de complexa estruturação de imagens e de
sentidos.
3. CAMÕES E AS ESCOLAS LITERÁRIAS
A Literatura
Brasileira, através dos tempos, assim como a Literatura de outras Nações, tem
mostrado inúmeras obras-primas de diversos autores que, por um motivo ou outro,
seguem os modelos dos grandes gênios que os antecederam e, conseqüentemente,
deixam sua herança aos seus sucessores.
Assim, vê-se a
contribuição de Camões para a riqueza da nossa Língua e Literatura, da mesma
forma que, também ele, herdara sua arte
de outros gênios. Sua importância é enorme e sua influência atinge nossos
poetas atuais. Essa genialidade atravessou quase quatro séculos, passando por
quase todas – senão todas – as Escolas Literárias e ali deixando sempre o que
lhe foi de melhor para que os futuros poetas vissem nele o mestre e, desta
forma, eternizassem-no.
Douglas
Tufano, a respeito do assunto, afirma:
“Alguns
escritores são capazes de criar tal expressão poética que passam a influenciar
toda a poesia posterior. Foi o que aconteceu com Luís de Camões, cujos poemas
têm servido de fonte de inspiração para inúmeras gerações de poetas.
Seus
sonetos amorosos tornaram-se célebres, influenciando inclusive autores
contemporâneos como Vinícius de Moraes. “[1]
Conforme essa
afirmação, Camões não pertenceu somente à sua época. Projetou-se no futuro pois, já no século XVI,
Luís de Camões era moderno. Observa-se tal modernidade no soneto de Vinícius de
Moraes, quando comparado a Camões:
1
Amor é fogo quer arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;
É
um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário por entre a
gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que ganha em se perder;
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
(Luís de Camões)
2
Distante o meu amor, se me afigura
O amor como um patético tormento
Pensar nele é morrer de desventura
Não pensar é matar meu pensamento.
Seu mais doce desejo se amargura
Todo instante perdido é um sofrimento
Cada beijo lembrado uma tortura
Um ciúme do próprio ciumento.
E vivemos partindo, ela de mim
E eu dela, enquanto breves vão-se os
anos
Para a grande partida que há no fim
De toda a vida e todo o amor humanos:
Mas tranqüila ela sabe, e eu seu
tranqüilo
Que se um fica o outro parte a
redimi-lo.
(Vinícius
de Moraes)
Esses dois
sonetos parecem conversar. A intertextualidade entre ambos é nítida. Vinícius,
indubitavelmente, tomou por inspiração sua musa tal qual Camões o fazia no
remoto século XVI.
É sabido que
cada Escola Literária tem características próprias, no entanto, tudo aquilo que
foi bom no passado irá permanecer, criando raízes e produzindo frutos,
adaptados, evidentemente, às características de cada movimento literário.
3.1. Influência
camoniana no Barroco:
Quando compara
o Barroco ao Renascimento, Enrique
Wölfflin afirma: “o Barroco
representa não um declínio, mas o desenvolvimento natural do Classicismo
renascentista para um estilo posterior”[2] .
Essa afirmação
permite-nos a constatação da genialidade de Camões, uma vez que além de
clássico, possuía, características que
iriam manifestar-se mais tarde no Barroco -
não apenas na poesia mas a prosa também iria beneficiar-se de sua
influência.
Ainda, segundo
Wölfflin, “esse estilo, diferentemente do Renascimento, já não é táctil,
porém visual, isto é, não admite perspectivas não visuais, e não revela sua
arte, mas a assimila”[3].
A partir dessa
idéia, estabelece-se a seguinte diferença:
RENASCIMENTO
|
BARROCO
|
1.
Linear:
sentido pela mão.
2.
Composta em plano:
de jeito a ser sentido.
3.
Partes coordenadas de
igual valor
4.
Fechada:
deixando de fora o observador.
5.
Claridade:
absoluta
|
1.
Pictórica:
seguida pela vista.
2.
Composta em profundidade:
de jeito a ser seguida.
3.
Partes subordinadas a um
conjunto.
4.
Aberta:
colocando dentro o observador.
5.
Claridade:
relativa
|
Com base no exposto, vemos que o Barroco
surgiu após um desenvolvimento também
chamado de Maneirismo, por ser uma forma
tardia do Renascimento, um estilo pré-barroco caracterizado pela ausência de
realismo e de impressionismo e que apresenta aspectos ornamentais marcantes.
No Brasil,
grandes autores valeram-se da sabedoria camoniana e nele inspiraram-se para a
elaboração de suas obras, evidentemente restritos às próprias limitações. Um
deles foi Gregório de Matos de quem Massaud Moisés afirma: “Decerto, o
poeta amparava-se nos modelos oferecidos pelos mestres barrocos, mas é Camões
quem lhe fornecia o contingente maior do arsenal imagético e filosófico de que
lançava mão para retratar a mulher amada e o sentimento que lhe despertava.
Dada a freqüência e a densidade com que surge na poesia de Gregório, Camões
constitui, sem dúvida, o guia do vate baiano.”[4]
Os sonetos
abaixo descritos apresentam semelhanças vocabular, estrutural e temática. O
primeiro, de Gregório de Matos, é dedicado “À Morte de Afonso da França”,
mancebo generoso, da principal nobreza da Bahia e muito amigo do poeta; o
segundo, de Camões, é dedicado a Dinamene, a “moça da China” que
morreu num naufrágio quando o poeta preferiu salvar sua obra-prima Os
Lusíadas ao invés da, então, amada. Comparemo-los:
1
“Alma
gentil, espírito generoso,
Que
do corpo as prisões desamparaste,
E
qual cândida flor em flor cortaste
De
teus anos o pâmpano viçoso.
Hoje
que o sólio habitas luminoso,
Hoje
que ao trono eterno te exaltaste,
Lembra-te
daquele amigo, a quem deixaste
Triste,
confuso, absorto e saudoso.
Tanto
tua virtude ao céu subiste,
Que
teve o céu cobiça de gozar-te,
Que
teve a morte inveja de vencer-te.
Venceste
o foro humano em que caíste,
Goza-te
o céu por premiar-te,
Senão
por dar-me a mágoa de perder-te.”
2
“Alma
minha gentil, que te partiste
Tão
cedo desta vida, descontente,
Repousa
lá no céu eternamente,
E
viva eu cá na terra sempre triste.
Se
lá no assento etéreo, onde subiste
Memória
desta vida se consente,
Não
te esqueças daquele amor ardente
Que
já nos olhos meus tão puro viste.
E
se vires que pode merecer-te
Alguma
coisa a dor que me ficou
Da
mágoa, sem remédio, de perder-te,
Roga
a Deus, que teus anos encurtou,
Que
tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão
cedo de meus olhos te levou.”
Um outro
exemplo da influência de Camões sobre Gregório de Matos está no soneto abaixo
em que Gregório de Matos traduz, em seus
versos, o estado de espírito da época por ele vivida.
A vós
correndo vou, braços sagrados
Nessa
Cruz sacrossanta descobertos,
Que para
receber-me estais abertos,
E por
não castigar-me estais cravados.
A vós,
Divinos olhos, eclipsados,
De tanto
sangue e lágrimas cobertos,
Pois
para perdoar-me estais despertos,
E por
não condenar-me estais fechados.
A vós,
pregados Pés por não deixar-me:
A vós,
sangue vertido para ungir-me:
A vós,
cabeça baixa por chamar-me:
A vós,
Lado patente, quero unir-me.
A vós,
Cravos preciosos, quero atar-me,
Para
ficar unido, atado e firme.
A forma do
soneto está ligada à de Camões (medida nova) e traz versos decassílabos e rimas
do tipo ABBA / ABBA / CDC / DCD. Quanto ao conteúdo, podemos notar um certo
“parentesco” com as produções camonianas, apesar, é claro, da temática diferir da usual no
Classicismo - cujas características
voltavam-se para o politeísmo e não para o
monoteísmo. Tudo isso deve-se, evidentemente, às características
próprias de cada Escola Literária. Entretanto, é inquestionável a presença de
Camões nesse soneto de Gregório de Matos.
As obras de
Camões são, sabidamente, poéticas mas encontramos sua influência também na
prosa. Padre Vieira em o “Sermão
do Mandato” tece toda sua argumentação sobre o episódio bíblico de Jacó
e Raquel tal qual Camões em seu soneto “Sete anos de pastor...”.
O raciocínio de ambos – Vieira e Camões – são parecidos diferenciando, apenas
na forma. Este, na forma de soneto, aquele em prosa.
Nos dois
textos o Amor é questionado: para Vieira o amor humano e o amor cristão
(divino) são colocados frente a frente e, evidentemente, o amor divino é
colocado em destaque a fim de mostrar a grandeza do verdadeiro amor; para
Camões, a exaltação do amor humano se faz presente. “Nesse poema é o
canto do Amor; o Amor em toda a sua plenitude, amor-doação, que se compraz na
fruição mesma da sensação amorosa, no sentir-se amado e amar, independendo de
condições materiais de espaço e tempo. Uma realidade que o poeta
conscientemente deforma, na sua visão do mundo, atribuindo a Jacó atitudes
espirituais que são muito mais dele, poeta, preocupado com o exame e as
repercussões deste mágico e misterioso sentimento que ‘nasce não sei onde,
vem não sei como e dói não sei por quê’. As figuras aproveitadas por Camões
se tornam personagens ideais e nesta nova posição entendemos melhor o situar-se
deste Jacó, vivido no poeta.”[5]
1
“Quatro
ignorâncias podem concorrer em um amante, que diminuam muito a perfeição e
merecimento de seu amor: Ou porque não se conhecesse a si; ou porque não
conhecesse a quem amava; ou porque não conhecesse o amor; ou porque não
conhecesse o fim onde há de parar, amando.
(...)
A
Segunda ignorância que tira o merecimento ao amor, é não conhecer quem ama a
quem ama. Quantas coisas há no mundo muito amadas, que, se as conhecera quem as
ama, haviam de ser muito aborrecidas! Graças logo ao engano e não ao amor.
Serviu Jacó os primeiros sete anos a Labão, e ao cabo deles, em vez de lhe
darem a Raquel, deram-lhe a Lia. Ah enganado pastor e mais enganado amante! Se
perguntarmos à imaginação de Jacó por quem servia, responderá que por Raquel.
Mas se fizermos a mesma pergunta a Labão, que sabe o que é e o que há de ser,
dirá com toda a certeza que serve por Lia. E assim foi. Servis por quem servis,
não servis por quem cuidais. Cuidais que vossos trabalhos e os vossos desvelos
são por Raquel, a amada, e trabalhais e desvelais-vos por Lia, a aborrecida. Se
Jacó soubera que servia por Lia, não servira sete anos nem sete dias. Serviu
logo ao engano e não ao amor, porque serviu para quem não amava. Oh quantas
vezes se representa esta história no teatro do coração humano, e não com
diversas figuras, se não a mesma! A mesma que na imaginação é Raquel, na
realidade é Lia; e não é Labão o que engana a Jacó, senão Jacó o que se engana
a si mesmo. Não assim o divino amante, Cristo. Não serviu por Lia debaixo da
imaginação de Raquel, mas amava a Lia conhecida como Lia. Nem a ignorância lhe
roubou o merecimento ao amor, nem o engano lhe trocou o objeto ao trabalho.
Amou e padeceu por todos, e por cada um, não como era bem que eles fossem senão
assim como eram. Pelo inimigo, sabendo que era inimigo; pelo ingrato, sabendo
que era ingrato; e pelo traidor, sabendo que era traidor: ‘Sciebat enim quisnam
esset, qui traderet eum’.
Deste
discurso se segue uma conclusão tão certa como ignorada; é que os homens não
amam aquilo que cuidam que amam. Por quê? Ou
porque o que amam não é o que cuidam; ou porque amam o que
verdadeiramente não há. Quem estima vidros, cuidando que são diamantes,
diamantes estima e não vidros; quem ama defeitos, cuidando que são perfeições,
perfeições ama e não defeitos. Cuidais que amais diamantes de firmeza, e amais
vidros de fragilidade; cuidais que amais perfeições angélicas, e amais
imperfeições humanas. Logo, os homens não amam o que cuidam que amam. Donde
também se segue que amam o que verdadeiramente não há; porque amam as coisas,
não como são, senão como as imaginam; e o que se imagina, e não é, não o há no
Mundo. Não assim o amor de Cristo, sábio sem engano: Cum dilexisset suos, qui
erant in Mundo.”[6]
2
“Sete
anos de pastor Jacó servia
Labão,
pai de Raquel, serrana bela;
Mas não
servia ao pai, servia a ela,
E a ela
só por prêmio pretendia.
Os dias,
na esperança de um só dia
Passava,
contentando-se com vê-la;
Porém o
pai, usando de cautela,
Em lugar
de Raquel lhe dava Lia.
Vendo o
triste pastor que com enganos
Lhe fora
assim negada a sua pastora,
Como se
a não tivera merecida,
Começa
de servir outros sete anos,
Dizendo:
- Mais servira, se não fora
Para tão
longo amor tão curta a vida!
3.2. Camões
no Arcadismo:
Os poetas
árcades, no Brasil, apesar de um contexto histórico diferente dos anteriores,
retoma algumas das características clássicas. Daí o nome de Neoclassicismo
dado ao Arcadismo.
“Valorizando
a razão e a simplicidade, os arcádicos inspiraram-se na sobriedade dos poetas
clássicos do Renascimento (sobretudo Camões) e da antigüidade grega e latina.
Daí o nome Neoclassicismo com que também se costuma designar esse período.”[7]
O novo
nesse movimento literário prende-se à mitologia greco-romana tão explorada
pelos poetas clássicos. A temática, entretanto, difere pois, aqui, os árcades
voltam-se para a natureza enquanto que lá, o antropocentrismo é
que era a grande razão do seu movimento que, além do mais, procurava
estabelecer um equilíbrio entre a razão e o sentimento.
Nem por isso
Camões deixou de estar presente no Arcadismo; de influenciar os poetas em suas
obras quer líricas, quer épicas.
Um dos autores
que merece destaque enquanto seguidor de Camões é Cláudio Manuel da Costa. “Seus
temas giram em torno das reflexões morais, das contradições da vida, tão ao
gosto dos poetas quinhentistas, percebendo-se inclusive uma marcante influência
camoniana em seus sonetos.”[8]
Observemos os
seguintes versos:
“Transforma-se
o amador na cousa amada,
Por
virtude do muito imaginar.”[9]
“Faz a
imaginação de um bem amado,
Que nele
se transforme o peito amante.”[10]
Tal influência
é notada no cultivo da poesia bucólica, pastoril na qual menciona a natureza
como refúgio
“Sou
pastor, não te nego; os meus montados
São
esses, que aí vês; vivo contente
Ao
trazer entre a relva florescente
A doce
companhia dos meus gados.”
ou, ainda, o sofrimento
amoroso, as musas:
“Parece, que
estes prados, e estas fontes
Já sabem, que
é o assunto da porfia
Nise, a
melhor pastora destes montes.”
A poesia épica
foi o grande desejo de muitos poetas. Quem não quer exaltar a beleza, os
feitos, o heroísmo de um povo? Quem não gostaria de registrar os fatos
históricos da pátria amada?
Muitos quiseram
e fizeram sua poesia épica sem, entretanto, a mestria do gênio. Dentre eles,
destaca-se José de Santa Rita Durão cujo poema, Caramuru,
caracteriza-se pela exaltação da terra brasileira, incorrendo o autor em
descrições da paisagem que lembram a literatura informativa do Quinhentismo,
valorizando a vida natural (mais pura, distante da corrupção). O elemento
indígena é tratado, pelo autor, dentro de um prisma informativo.
“É
evidente a influência camoniana na distribuição da matéria épica e na forma;
por outro lado, Santa Rita não se utiliza da mitologia pagã, como Camões em Os
Lusíadas, mas apenas de um conservadorismo cristão.
Quanto à
forma, o poema é composto de dez cantos, versos decassílabos, oitava rima
camoniana (ABABABCC). A divisão é tradicional das epopéias, constando de proposição, invocação, dedicatória,
narração e epílogo.”[11]
Como exemplo,
selecionamos duas estrofes do Canto VI, onde é narrada a morte de Moema.
“Copiosa
multidão da nau francesa
Corre a
ver o espetáculo,assombrada;
E
ignorando a ocasião da estranha empresa,
Pasma da
turba feminil, que nada.
Uma que
às mais precede em gentileza
Não
vinha menos bela, do que irada;
Era
Moema, que de inveja geme,
E já
vizinha à nau se apega ao leme.
(...)
- Bárbaro
(a bela diz:) tigre e não homem...
Porém o
tigre, por cruel que brame,
Acha
forças no amor que enfim o domem;
Só a ti
não domou, por mais que te ame.
Fúrias,
raios, coriscos, que o ar consomem,
Como não
consumis aquele infame?
Mas
pagar tanto amor com tédio e asco...
Ah! Que
corisco és tu... raio... penhasco!”
3.3. A
importância de Camões no Romantismo:
O Romantismo,
enquanto Escola Literária, opõe-se ao Classicismo exatamente por ser essa a sua
meta principal pois “há uma tendência a caracterizar a nova atitude do
espírito humano estabelecendo-se uma oposição entre Romantismo e Classicismo.”[12]
A despeito de
todas as características românticas, Camões torna-se importante a esse
movimento à medida que o poeta não se contentou em ater-se às rígidas regras
clássicas; já em sua época, Camões antecipa traços do intimismo romântico
através das idéias, das ações e do sentimento poético.
Mesmo com
características próprias, os poetas românticos não deixam de usar como tema o Amor,
a Mulher, o Nacionalismo.
Quanto à
estrutura do poema, os românticos procuram libertá-la das normas clássicas, mas não abandonam a medida
nova camoniana – o soneto; a medida velha também aparece de quando em vez em
alguns poemas românticos e a poesia épica é transformada em prosa, como
romance.
A estrutura
sofreu modificações mas a essência – conteúdo, tema – é universal e, em sendo
assim, está presente em toda e qualquer obra em que haja o questionamento do
ser humano.
O soneto
abaixo mostra bem o quanto Camões, alguns séculos após sua existência física,
ainda está vivo na alma dos poemas e... na dos poetas...
“Pálida
à luz da lâmpada sombria,
sobre o
leito de flores reclinada,
Como a
lua por noite embalsamada,
Entre as
nuvens do amor ela dormia!
Era a
virgem do mar, na escuma fria
Pela
maré das águas embalada!
Era um
anjo entre nuvens d’alvorada
Que em
sonhos se banhava e se esquecia!
Era mais
bela! o seio palpitando...
Negros
olhos as pálpebras abrindo...
Formas
nuas no leito resvalando...
Não te
rias de mim, meu anjo lindo!
Por ti –
as noites eu velei chorando,
Por ti –
nos sonhos morrerei sorrindo!”
(Álvares
de Azevedo)
Álvares de
Azevedo, como todo poeta da Segunda geração romântica, trata o Amor e a Mulher
amada de forma platônica, idealizada. Ora, não foram essas as premissas para os
sonetos de Camões. Evidentemente, na época clássica, o platonismo e a
idealização davam-se de maneira racional – se é que se pode chamar “racional” o
sentimento -, enquanto que no Romantismo essas características mais subjetivas
traduziam a explosão do sentimento por alguém. Mas, nem por isso os românticos
deixaram de seguir o mestre clássico e tampouco Camões deixou de ser romântico
mesmo quando inserido nas características clássicas.
Numa análise
mais aprofundada percebemos nos poemas de Castro Alves, mais especialmente em Navio
Negreiro que, se comparado à grandiloqüência de sua linguagem com a da
passagem d’Os Lusíadas em “Gigante Adamastor”, a
influência camoniana é nítida.
“E
existe um povo que a bandeira empresta
P’ra
cobrir tanta infâmia e cobardia!...
E
deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto
impuro de bacante fria!
Meu
Deus! Meu Deus! Mas que bandeira é esta,
Que
impudente na gávea tripudia?!...
Silêncio!...
Musa! Chora, chora tanto
Que o
pavilhão se lave no teu pranto...
(...)
Levantai-vos,
heróis do Novo Mundo...
Andrada!
Arranca este pendão dos ares!
Colombo!
Fecha a porta de teus mares!”
(Castro
Alves)
XLI
“E
disse: Ó gente ousada, mais que quantas
No mundo
cometeram grandes coisas,
Tu, que
por guerras cruas, tais e tantas,
E por trabalhos
vãos nunca repousas,
Pois os
vedados términos quebrantas
E
navegar meus longos mares ousas,
Que eu
tanto tempo há já que guardo e tenho,
Nunca
arados de estranho ou próprio lenho:
(...)
L
Eu sou
aquele e grande Cabo
A quem
chamais vós outros tormentório,
Que
nunca a Ptolomeu, Pompônio, Estrabo,
Plínio e
quantos passaram fui notório.”
3.4. O
Parnasianismo e Camões:
A Escola
Parnasiana inserida na Realista apresenta características extremamente opostas às do Classicismo.
Entretanto, a característica que mais identifica uma poesia como ‘parnasiana’ é
a perfeição formal. Tal perfeição foi buscada pelos poetas lá nos remotos
tempos clássicos: o soneto. Não estaria aí a presença, mais uma vez de
Camões? É claro que sim.
Além da grande
utilização do soneto para expressarem a perfeição da poesia, os poetas
parnasianos valiam-se, também da mitologia greco-romana tão explorada por
Camões. Se os parnasianos não primavam
pelo conteúdo substancial, dadas as circunstâncias da época, a descrição
tornava-se-lhes a tônica de suas poesias e nestas embutiam-se os temas tão
decantados por Camões.
Vejamos como
Alberto de Oliveira traduz esses aspectos em seu soneto Vaso Grego.
“Esta de
áureos relevos, trabalhada
De divas
mãos, brilhante copa, um dia,
Já de
aos deuses servir como cansada,
Vinda do
Olimpo, a um novo deus servia.
Era o
poeta de Teos que a suspendia
Então,
e, ora repleta ora esvasada,
A taça
amiga aos dedos seus tinia,
Toda de
roxas pétalas colmada.
Depois...
Mas o lavor da taça admira,
Toca-a,
e do ouvido aproximando-a às bordas
Finas
hás de lhe ouvir, canora e doce
Ignota
voz, qual se da antiga lira
Fosse a
encantada música das cordas,
Qual se
essa voz de Anacreonte fosse.”
3.5. Aspectos camonianos no Simbolismo:
A Escola
Simbolista prima pela transcendência, pela oposição entre espírito e matéria.
Seus autores, apesar de uma aparente objetividade traduzem em seus poemas uma
preocupação à luz do individual, pois até mesmo a generalização revela o íntimo
de um ser preocupado com o Homem, a partir da sua dúvida pessoal.
Não são
tratadas, nos poemas, emoções periféricas ou vulgares; antes há uma preocupação
de ordem mais alta nos versos simbolistas; é como se o poeta se debruçasse à
beira do seu cais interior e procurasse trazer do fundo das águas algo de que
percebe o brilho intenso.
“Trata-se
nitidamente de uma atitude de reflexão; a matéria da poesia se apresenta em
termos de elementos intelectuais. As palavras revelam uma concepção, ou, pelo
menos, uma preocupação com uma concepção mística da vida.”[13] Há, portanto, maior preocupação coma
essência vital.
Camões também
em sua época mostrava traços reflexivos, questionadores da essência humana, do
mistério transcendental, sem, no entanto, abandonar as características da
Escola a qual pertencia mas, por conta de sua genialidade não limitou-se
totalmente a tais características; permitiu-se vislumbrar o conflito da alma
humana, principalmente diante de um sofrimento que pode, por vezes, levar o
indivíduo à loucura.
Evidentemente,
Camões não colocou a liberdade da essência humana na morte ou na loucura porém,
viu-a como um seguimento da vida terrestre. Nesse aspecto a presença camoniana
no Simbolismo é nítida.
Vejamos, mais
uma vez, alguns versos do seu soneto dedicado a Dinamene:
“Alma
minha gentil, que te partiste
Tão
cedo desta vida, descontente,
Repousa
lá no céu eternamente,
E
viva eu cá na terra sempre triste.
Se
lá no assento etéreo, onde subiste
Memória
desta vida se consente,
Não
te esqueças daquele amor ardente
Que
já nos olhos meus tão puro viste.”
A visão de
transcendência, da oposição matéria x espírito nesses versos é inquestionável.
Cruz e Sousa,
poeta expressivo do Simbolismo vale-se, também, da transcendência, do conflito
humano, da prisão da essência humana num plano material. Um de seus sonetos
“Cárcere das Almas” traduz brilhantemente essa idéia. Nele o poeta questiona a
vida interior, introspectiva, silenciosa, o homem voltado para dentro de si
mesmo. Afinal, “Que chaveiro possui as chaves do Céu, capazes de abrir as
portas do Mistério?”. Isso, certamente, vai ao encontro do
questionamento camoniano, da dúvida quanto a existência de um plano espiritual:
“Se lá no assento etéreo onde subiste / Memória desta vida se consente /
Não te esqueças daquele amor ardente / Que já nos olhos meus tão puro viste”.
Notamos, desta
forma, aspectos camonianos no soneto de Cruz e Sousa. Se a semelhança da
essência poética não bastasse, ainda temos o aspecto formal: soneto com versos
decassílabos, com rimas ABBA / ABBA / CCD / EED. Fonicamente, percebemos a semelhança
pois o ritmo em ambos os sonetos é
marcado na sexta sílaba poética.
Vejamos,
agora, o Cárcere das Almas:
“Ah!
Toda a alma num cárcere anda presa,
Soluçando
nas trevas, entre as grades
Do
calabouço olhando imensidades,
Mares,
estrelas, tardes, natureza.
Tudo se
veste de uma igual grandeza
Quando a
alma entre grilhões as liberdades
Sonha e
sonhando, as imortalidades
Rasga no
etéreo Espaço da Pureza.
Ó almas
presas, mudas e fechadas
Nas
prisões colossais e abandonadas,
Da dor
do calabouço, atroz, funéreo!
Nesses
silêncios solitários, graves,
Que
chaveiro do Céu possui as chaves
Para
abrir-vos as portas do Mistério?!”
3.6. Traços camonianos no Modernismo:
O Modernismo
caracteriza-se pela ruptura com todos os modelos do passado, entretanto, por
mais que tentassem romper com tais modelos restaram, aos autores modernos,
elementos importantes dos quais valeram-se (esses autores) para uma nova
tradução da realidade ocidental.
Essa realidade
deveria ser mostrada como sempre foi feita: sob um nome definidor das
características próprias da época – uma rotulação essencialmente estética.
Assim, recorreu-se a um nome genérico, capaz de englobar as mais variadas
tendências da literatura a partir do alvorecer do multifacetado século XX: Modernismo,
palavra que tem, portanto, a função de representar tais tendências
independentemente do elemento meramente cronológico. Isso, porém, ao invés de
prejudicar, só trouxe ao mundo ocidental um dos mais fecundos e soberbos
movimentos literários.
Desde Fernando
Pessoa até Mário de Andrade, percebemos uma característica marcante dessa
época: o hermetismo próprio, aliás, dos poetas dessa fase.
Mas... onde
entra Camões nessa modernidade?
Exatamente na
visão hermética do poeta.
O hermetismo é
um dos traços responsáveis pela dificuldade de penetração no mistério da
poesia, que se configura sobretudo na imaginística de que faz uso o poeta.
O hermetismo,
aliás, não é exclusividade dos modernistas. Já vimos em outras Escolas
Literárias esse traço. “Mesmo os clássicos apresentam a sua dose, às
vezes, bem forte de hermetismo, como é o caso de Camões e, sobretudo, de Luís
de Gôngora.”[14]
Vejamos alguns
trechos de poemas de poetas modernistas que bem explicitam esses traços:
1
“Atravessa
esta paisagem o meu sonho dum porto infinito
E a cor
das flores é transparente de as velas de grandes navios
Que
largam do cais arrastando nas águas por sombra
Os
vultos ao sol daquelas árvores antigas...
O porto
que sonho é sombrio e pálido
E esta
paisagem é cheia de sol deste lado...
Mas no
meu espírito o sol deste dia é porto sombrio
E os
navios que saem do porto são estas árvores ao sol...”
(Fernando
Pessoa)
2
“Eia!
eia! eia!
Eia
eletricidade, nervos doentes da Matéria!
Eia
telegrafia sem-fios, simpatia metálica do Inconsciente!
Eia
túneis, eia canais, Panamá, Kiel, Suez!
Eia todo
o passado dentro do presente!
Eia todo
o futuro já dentro de nós! Eia!...”[15]
3
“Irene
preta
Irene
boa
Irene
sempre de bom humor.
Imagino
Irene entrando no céu:
-
Licença,
meu branco!
E São
Pedro bonachão:
-
Entra,
Irene, você não precisa pedir licença.”
(Manuel
Bandeira)
4
“Tua
presença é uma carne de peixe”
(Mário
de Andrade)
5
“Nasce
não sei onde, vem não sei como
e dói
não sei por quê”
(Camões)
4. AS
TRANSGRESSÕES DE CAMÕES
Como vimos, a
partir do Romantismo, as Escolas Literárias procuraram contrariar os modelos clássicos. No entanto
Camões transgrediu esse fato.
Transgredir
significa ir além. A inteligência, a visão, a genialidade
de Camões atingiram poetas que, contrariando os princípios da Escola a que
pertenciam, ou incluíram ou mencionaram Camões em suas obras.
E. M. de Mello
e Castro faz um ensaio sobre as transgressões de Camões. Diz ele:
“Não
admira que as situações de conflito social, moral, psicológico, político, ideológico,
religioso, afetivo, econômico etc., sejam a substância existencial do poeta. As
transgressões que agora nos interessam são contudo os indícios textuais que se
encontram na sua poesia e a que poderemos chamar os traços da modernidade de
Camões. Indícios esses que são reveladores do conflito estrutural que constitui
o cerne da obra de Camões, colocado no encontro e na separação de várias águas
e cuja imagem oficial do poeta da portuguesidade tem obscurecido quase
completamente.”[16]
A presença dessa
modernidade está em vários poetas, como por exemplo:
4.1. Vinícius de Moraes:
Ao observarmos
as obras de Vinícius de Moraes, notamos que tanto ele como Camões usam uma
linguagem lógica, a preferência pelo vocabulário abstrato, pelo apuro formal, a
obsessão pelo tema de brevidade da vida e o próprio apego ao soneto. Têm em
comum, também, as fontes de inspiração:
Soneto
de separação
De
repente do riso fez-se o pranto
Silencioso
e branco como a bruma
E das
bocas unidas fez-se a espuma
E das
mãos espalmadas fez-se o espanto.
De
repente da calma fez-se o vento
Que dos
olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do
momento imóvel fez-se o drama.
De
repente, não mais que de repente
Fez-se
de triste o que se fez amante
E de
sozinho o que se fez contente.
Fez-se
do amigo próximo o distante
Fez-se
da vida uma aventura errante
De
repente, não mais que de repente.
4.2. Caetano Veloso:
Caetano tem
muitos objetos de inspiração: a terra natal (Alguém me avisou); os
lugares que vive – cidades, países (Sampa); ordem política
(Tropicália); os problemas sociais – típicos da época que transcorre
(Purificaram o Subaé e Podres Poderes).
O amor e a
mulher são temas constantes, a exemplo de Camões, tratados de várias formas,
ora concretas, ora abstratas: Beleza pura; Muito; Leãozinho e Você é linda.
Outra
característica desse poeta – e rara em outros compositores – é a de ”encarnar”
o seu lado feminino, escrevendo poesias como mulher, ou seja, vendo o mundo
pelo prisma feminino. Aliás, esta característica foi muito usada no
Trovadorismo, nas cantigas de Amigo. Tal encarnação é tão real a ponto de ter
um homem como objeto do desejo e amor
físico ou simbólico: Menino do Rio; Esse cara; Dom de iludir e Bárbara.
A natureza
observada sob um prisma contemplativo, não ecológico, é, também, tema constante
em suas obras (Lua de São Jorge e Luz do Sol).
O uso de
expressões populares – gírias e palavrões – é comum nas obras de Caetano cujo
objetivo é aproximar-se do realismo brasileiro.
Numa análise
mais profunda das obras de Caetano Veloso, veremos que o questionamento da
condição humana se faz presente em quase todas as suas poesias, não esquecendo,
é claro, o lirismo que ele usa com mestria. Assim como Camões, Caetano utiliza
os temas universais para traduzir o seu estado de espírito, inspiração e a realidade
do seu país. Esses temas são: o Amor, a Mulher, a Pátria.
Sampa
Alguma
coisa acontece no meu coração
Que só
quando cruza a Ipiranga e Av. São João
É que
quando eu cheguei por aqui
Eu nada
entendi
Da dura
poesia concreta de tuas esquinas
Da deselegância discreta de tuas meninas
(...)
Podres Poderes
Enquanto
os homens exercem seus podres poderes
Motos e
fuscas avançam os sinais vermelhos
E perdem
os verdes
Somos
uns boçais
(...)
Será que nunca faremos senão confirmar
A
incompetência da América Católica
Que
sempre precisará de ridículos tiranos?
Será
será que será que será que será
Será que
essa minha estúpida retórica
Terá que
soar, terá que se ouvir
Por mais
zil / anos?
Enquanto
os homens exercem seus podres poderes
Índios e
padres e bichas, negros e mulheres
E
adolescentes
Fazem o
carnaval
(...)
Enquanto
os homens exercem seus podres poderes
Morrer e
matar de fome, de raiva e de sede
São
tantas vezes gestos naturais
Eu quero
aproximar o meu cantar vagabundo
Daqueles
que velam pela alegria do mundo
Indo
mais fundo
Tins e
bens e tais.
Você é linda
Fonte de
mel
Nuns
olhos de gueixa
Kabuki,
máscara
Choque
entre o azul
E o
cacho de acácias
Luz das
acácias
Você é
mãe do sol
(...)
Você é
linda
E sabe
viver
Você me
faz feliz
Esta
canção é só pra dizer
E diz
(...)
4.3. Chico Buarque de Holanda:
Tanto mar
Foi
bonita a festa, pá
Fiquei
contente
E ‘inda
guardo, renitente
Um velho
cravo para mim.
Já
murcharam tua festa pá
Mas
certamente
Esqueceram
uma semente
N’algum
canto do jardim
Sei que
há léguas a nos separar
Tanto
mar, tanto mar,
Sei
também quanto é preciso, pá
Navegar,
navegar
Canta a
primavera, pá
Cá estou
carente
Manda
novamente
Algum
cheirinho de alecrim.
Este poema já
nasceu musicado pois trata-se de um fado – música tipicamente portuguesa. Aqui,
o autor exprime sua admiração e contentamento pelo momento político e social
por que passa Portugal: A Revolução dos Cravos – após longo período
ditatorial.
Ao mesmo tempo
que lamenta a situação de ditadura que persiste no Brasil em época concomitante
com a portuguesa, profetiza que tudo está para mudar, talvez inspirado nas
mudanças de Portugal.
A “festa”
significa a própria revolução. Refere-se a Portugal como “pá” recordando os
laços históricos daquele país com o nosso, pois “pá” é uma expressão portuguesa
e carinhosa de “pai”. O “cravo” simboliza de forma clara e real essa revolução.
“Navegar” diz respeito ao tempo que ainda há de passar e as modificações que ainda
virão antes que o Brasil, inspirado pelo “cheiro de alecrim” possa também ter
sua revolução social.
As metáforas e
a simbologia usadas no poema são próprias à mensagem que Chico Buarque quis
transmitir. Elas estão ligadas à temática principal: o patriotismo. Aí sente-se
uma vez mais a presença de Camões, talvez até na tentativa de exaltar sua tão
amada pátria na inteligência de Chico, levando-se em conta os temas
inspiradores da poesia: o mar, as revoluções, as navegações. Não foram esses
temas que imortalizaram Camões na sua obra-prima Os Lusíadas?
Evidentemente
não estamos comparando a canção de Chico com o poema épico de Camões. A
grandiosidade de Os Lusíadas é incomparável, entretanto, a genialidade
camoniana – como já pudemos explicitar – não pertenceu apenas á sua época. Ela
transcendeu ao tempo e ao espaço. Camões é mais que a matéria: é a alma do amor
português, seja ele cantado através do fado ou da poesia lírica ou, ainda, da
poesia épica. Essa Alma é, sem dúvida,
imortal e Camões é parte ativa da Alma Portuguesa!
6. CONCLUSÃO
Luís Vaz de
Camões é um poeta atual, pois sua genialidade não mais pertence ao mundo físico
– limitado por sua gente e por seu povo -, mas ao Universo.
Nesse universo
sentimos a presença de Camões em todos cuja alma é sensível o bastante para
apreciar a beleza da natureza, para valorizar o povo de sua Nação, para valorizar
a mulher na sua atuação nos meios social e familiar, enfim, questionar a
essência humana.
Se Camões de 1500 transpôs céus, mares – nunca dantes navegados -, épocas; intrigou tantos poetas e
estudiosos de sua obra; perpetuou não apenas a obra mas, principalmente, o Amor
– que o poeta tentou racionalizar em sua época -, hoje temos certeza de que sua
genialidade não foi por acaso – fruto de um ser superdotado – foi, é e será
sempre a mestra de tão nobres poetas atuais que fazem valer o aprendizado
cantando e decantando essencialmente aquele Amor camoniano.
O Amor é, de
fato, o elemento que pode modificar uma Nação porque é amplo e global.
Camões não
particularizou esse Amor. Antes exaltou-o, depois praticou-o e, finalmente,
deixou-o como legado a todos que querem senão segui-lo, ao menos entendê-lo!
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35, 61, 155-160.
[1] TUFANO, Douglas. Estudos
de Literatura Brasileira. p. 49.
[2] WÖLFFLIN, Enrique.
Conceptos Fundamentales en la Historia del Arte. Madrid,
1961, pp.
164,165.
[3] Idem, p. 165.
[4] MOISÉS, Massaud. História
da Literatura Brasileira. p. 110.
[5] PROENÇA Filho, Domício. Estilos
de Época na Literatura. Rio de Janeiro: Liceu, p. 30.
[6] VIEIRA, Antonio Pe. Sermões.
Rio de Janeiro: Agir, pp. 59-65.
[7] TUFANO, Douglas. Opus cit.
p. 53.
[8] NICOLA, José de.
Literatura Brasileira: das origens aos nossos dias. São Paulo: Scipione, p. 55.
[9] Camões, séc. XVI
[10] Cláudio Manuel da Costa,
séc. XVIII
[11] NICOLA, José de. Opus
cit., p. 58.
[12] PROENÇA Filho, Domício. Estilos
de Época na Literatura. Rio de Janeiro: Liceu, 1969, p. 177.
[13] PROENÇA Filho, Domício.
Opus cit. p. 236.
[14] PROENÇA Filho, Domício.
Opus cit. p. 279.
[15] Álvaro de Campos,
heterônimo de Fernando Pessoa – fragmento da Ode Triunfal.
[16] CASTRO, E. M. de Mello . Literatura
Portuguesa de Invenção, São Paulo: Difusão Editorial S/A, 1984, pp. 58
a 68.
HERNANDO
FEITOSA BEZERRA CHAGAL